domingo, 24 de janeiro de 2010

Old School: uma pequena história

A motivação de escrever este post veio em parte da minha namorada e de outros amigos que tem acompanhado este blog (e outros pela blogsfera) e muitas vezes me perguntam "Tá bom, isso é muito interessante e tal, mas afinal o que que é old school que você tanto fala?”. Espero poder esclarecer um pouco as coisas conhecendo as minhas limitações sobre o assunto.
Afinal, o que é “old school” e porquê ele tem tido essa alta popularidade? Puxe uma caneca de cerveja e sente-se aqui perto da lareira…

Primeiro, é preciso esclarecer que esse movimento vem evoluíndo nos EU pelo menos há 15 anos. Os anos 90 foram marcados por uma draconiana perseguição da TSR a todos os fãs que queriam contribuir de alguma forma para o jogo, atacando um espírito que germinou na política dessa empresa quando Gary Gigax era seu presidente. Nesta época, o mercado de rpg era ainda muito pequeno, e por isso muitos talentos foram descorbertos em eventos, convenções ou até mesmo com publicações as margens do oficial. O próprios livros básicos, como podem comprovar as opiniões de Gary durante esses longos anos antes do seu falecimento, estimulavam aos jogadores a terem sua própria interpretação das regras, o que muitos fizeram, criando uma miríade de “house rules” e variantes do ad&d. Essa ideía continuou durante a era do 2nd edição, mas a política da empresa não, e muita gente foi silenciada, o próprio Gary sendo um bom exemplo.
Segundo, dito isto sobre o que aconteceu “lá fora”, é preciso fazer um paralelo com o que aconteceu “aqui dentro”. No brasil, o AD&D original nunca foi lançado, o mesmo sendo dito do D&D, que eram duas linhas separadas. Este último era possível encontrar uma versão lusitana do básico “livro vermelho” de Mentzer, e uma outra versão, também para iniciantes, lançada pela Grow (a querida caixinha). Old school no brasil se refere basicamente aos livros lançados pela abril jovem do AD&D 2nd, já que foi atráves dessa versão que o grande público brasileiro teve acesso ao clássico.
O Old school, propriamente dito, começou quando a “caça as bruxas” da TSR terminou com a compra da empresa pela Wizards, que lançou uma nova versão das regras e uma forma de se publicar para ela através de sua licença OGL. Durante os primeiros anos, basicamente se usou a licença para aproveitar o sucesso da terceira edição. Os primeiros produtos que acenderam a chama do revival foram os módulos de empresas como Necromancer Games e Goodman Games. A primeira, através da sua linha “Regras da 3rd/Charme da 1st”, e a segunda com seus “Clássicos da exploração de marmorras”, trouxeram para o novo jogo o estilo de aventura que apelava aos da velha guarda. Indo mais além, discussões em fóruns fizeram nascer o projeto Castles & Crusades: uma tentativa de reeditar as regras da edição da Wizards com as impressões e escolhas do AD&D de Gigax. Todas essas tentativas alcançaram um sucesso considerável, tanto que essas empresas fizeram um nome para si no mercado e continuam ativas até hoje.
Contudo, ainda existiam redutos de jogadores da velha guarda (os grognards) que nunca abandonaram o jogo original. Se aglomerando em fóruns pela internet como a Dragonsfoot e o Knights & Knaves Alehouse, eles ainda discutiam as velhas regras e o velho charme. Foi neste lugares que se começou a discutir a possibilidade de re-criar as regras da primeira edição através dos auspícios da OGL. Impedidos de chamar esse produto de D&D pelas limitações da licença, ou o uso de certas propriedades intelectuais (como alguns monstros icônicos), originou-se o termo Retro-clone ou Simulacrum Game, que significam uma tentativa de recriar um conjunto de regras antigo com a maior fidelidade possível sem ferir direitos autorais. O jogo que merece o título de ser o primeiro a ser produzido sob essa filosofia é o OSRIC, um acrônimo de “Recurso de Compilação e Index da Velha Guarda”, um jogo OGL que reedita as regras do AD&D. No início, o osric era apenas uma desculpa de se lançar comercialmente produtos compatíveis com o AD&D através de outro nome e outra licença, mais aberta (a licença Osric). Uma certa apreensão se instalou no mercado com a possibilidade de retaliação pela Wizards, em parte pela lembrança do tratamento dispensado aos fãs pela TSR, mas isso não aconteceu. Isso pavimentou o caminho para outras publicações, como o Labyrinth Lord e o Sword & Wizardry, o primeiro sendo uma reedição do livro vermelho do D&D basic, o segundo sendo uma versão esclarecida do clássico e pioneiro Dungeons&Dragons de 74 (para quem não sabe, a origem do hobby e a grande influência para a vida de todos nós), e o Revival Old School ou Renascença Old School ganhou popularidade e alcance. Ele perdeu sua intenção de apenas servir ponte de acesso aos materiais mais antigos e versões mais polidas e completas foram criadas.
Para muitos, o old school é uma forma de voltar as origens, continuar jogando seu rpg favorito e ter acesso a um catálogo de novos lançamentos para ele. Mas até esse termo já foi refinado. Existem jogos que se consideram pertencentes a esse movimento e que não re-criam nenhum jogo particular da época, exemplos sendo o Mazes & Minotaurs e o Encounter Critical. O conceito se refere mais a um “como seria se o mercado de rpg evoluísse em direções diferentes as tomadas, outras escolhas tivessem sido feitas, que tipo de rpgs teríamos hoje?”. Um processo totalmente radical de pensar RPG e o seu significado. Se busca inspiração no passado para recriar o presente, uma ideía que não surgiria sem uma insatisfação com o estado que as coisas estão. Muitos motivos existem para não gostar do mercado hoje, e o movimento é a forma de se pensar diferente e com liberdade.
Para os curiosos, o Brasil também tem sua versão de um rpg Old School: o Old Dragon feito pelo pessoal do blog Vorpal. Como afirmei acima, em nossa terra temos um afinidade muito maior com o AD&D em sua segunda edição do que as versões originais da década de 1970, um jogo que pode ser considerado um besta totalmente diferente, com suas próprias escolhas e afinidades, e a ideía do que é Velha Guarda pode ser bem diferente da dos nossos vizinhos americanos. Quanto a mim, que comecei nessa época, o estilo da primeira edição tem mais um cheiro “novo” e “refrescante” do que “velho” e “nostálgico”, e tenho tentado emular isso em meus jogos atuais.
Para os que entraram no hobby a pouco tempo, esses RPGs são uma oportunidade de se conhecer o estilo dos antigos, e entender a evolução do termo e do mercado ao longo do tempo. Todos eles são divertidos pelo seu próprio mérito, mas é preciso manter a cabeça aberta para um modo diferente de jogar. Se nos jogos atuais temos regras para tudo, os sistemas são elegantes mas “pesadões”, que desestimulam as house rules apenas pela enorme quantidade de trabalho necessária para fazê-las funcionar, esses rpgs são simples e encantadores. Um enfoque muito maior no jogador e sua atenção aos detalhes, ao invés do conhecimento das regras, é oferecido, o que pode seduzir algumas pessoas que nunca jogaram algo do tipo. Minha recomendação dar uma oportunidade a esses jogos. Não é preciso cair de cabeça no movimento, mas estar antenado que ele existe e o que significa só tem a melhorar o prazer com que jogamos rpg. No mais, eu mesmo fui “fisgado” por ele.
Até o próximo post então.

Um comentário:

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